28.1.10

Bühne

Oficina
Quando "Os Sertões" foi encenado no Volksbühne em 2005 os jornais sensacionalistas de Berlim se puseram contra. Estaparam nas capas com letras enormes, "24 horas de orgia-pornografica", ou "cuidado, pláteia! grande risco de participação", ou ainda "teatro pornografico com estudantes". Esse último se referindo aos 43 estudantes de cerca de 14 anos que participaram da peça. Apesar de todo rebuliço que a obra causou por aqui, falo pro pessoal do teatro sobre Zé Celso e seu teatro inquieto, e eles não conhecem. Mas como pode, se eles trabalham com Teatro do Oprimido e muito admiram o trabalho de Boal? Bom, estou preparando os textos para levar no domingo.

Oprimido
Hoje na pequena reunião do grupo, num bar sujo e apertado de Neukölln, foi discutido como será o encontro em maio dos grupos que trabalham com Teatro do Oprimido na Alemanha. Encontro irá coincidir com o aniversário da morte de Boal. E antecede o encontro de julho no Rio.

Zé Celso
"A orgia é o fundamento do meu teatro e o desejo da orgia vive em cada cultura e em cada pessoa. O teatro pode contribuir para libertar esse desejo", Zé Celso ao jornal Neues Deutschland. Saiu do hospital, terá marcapasso implantado e passa bem.

26.1.10

Sol (II)

Primeiro dia com sol forte, terá duração de incríveis sete horas! Entretanto, dia mais frio do ano até agora, amanhã ainda piora, chegando a extremos -19°C, com absurda sensação térmica de -27°C. Em janeiro o sol aparecerá no total durante 24 horas. Até o dia 16, ele não havia aparecido uma hora sequer. A boa notícia é que, segundo essa lógica, ele dará as caras mais de uma hora por dia nessa semana. Esse é um dos 10 invernos mais frios na Alemanha dos últimos 100 anos. É demais pra alguém que sempre viveu ali quase embaixo da linha do Equador, o sol vindo direto, nem sombra fazia. Aqui ele vem na tangente, você nem sente.
E sim, eu ainda me surpreendo (e muito) com isso tudo.

21.1.10

Kino

Em Berlim são mais de 100 cinemas pela cidade, com mais de 285 salas de projeção e 9,1 Mi de frequentadores. Dados de 2007 da FFA - Filmförderanstalt, fundação que estuda toda a cadeia produtiva cinematográfica da Alemanha. Mais impressionante que os números, são os cinemas em si. Em sua maioria, cinemas de rua, com no máximo 3 salas, as quais não são muito grandes. É possível ver qualquer filme em Berlim, a programação chega a ser cansativa. É impossível estar presente em tudo. Gosto muito do Babylon Kino, onde sempre tem programações especiais, como cinema mudo uma vez por mês e novos filmes alemães nas quintas, sempre com a presença dos diretores e elenco. O outro cinema que gosto bastante é o Kino International, bloco de cimento quadrado na Karl Marx Alle, projeção Cinemascope, som perfeito. Cinema lindo por dentro, a cafeteria e a sala de projeção são fantásticas. Em Berlim acontece todo ano a Berlinale. Dos maiores festivais de cinema do mundo.Tem um estúdio de gravação em Babelsberg onde já foram filmados grandes produções como, O Pianista, O Jardineiro Fiel, Speed Racer, etc. Também são várias as instituições que estudam e trabalham com o tema na cidade, FFA, Medienboard e Kulturinitiative. Nesse contexto, Berlim concorre para ser a Cidade do Cinema da Unesco.

Sol

O sol apareceu em Berlim! Tímido ainda, não deixa que o vejamos, escondindo, ainda por trás de nuvens cinza da cor do concreto que encombre e recobre toda a cidade. O céu azul, um azul também tímido, sem muita cara de azul. Mas é azul e não mais aquelas tonalidades de cinza e branco que encobriam tudo. Os pássaros que habitam o telhado do prédio da universidade parecem também estarem fascinados. Dão voltas e mais voltas, passando bem perto da janela onde me vejo refletido.

18.1.10

Secreto

Berlim é cheio de lugares secretos. O antigo centro de espionagem da CIA no Teufelsberg talvez seja o maior exemplo. Mas ainda existem lugares secretos aos montes, completamente escondidos. São bares, cafés, boates, galerias de arte, cinemas e o que mais se puder imaginar. O Bar25, um dos mais famosos de Berlim, se encontra na Holzmarktstrasse, rua que é margem do Rio Spree, lá passava o Muro e ainda existe por lá pedaço dele, a West Side Galery. Na continuação da galeria, parte do muro já não mais conservado, encontra-se uma espécie de buraco tapado com o que parecia ser telhas de zinco. Lá é a entrada do Bar25, lugar preferido de Tarantino aqui em Berlim. Ontem estava lotado, só em maio agora, na reabertura. Bem próximo ao Bar25 tem a Berghain - Panorama Bar, o que dizem ser a melhor boate do mundo. Lá existe um quarto escuro, onde rola de tudo. Me disseram que só para homens homos, pena. Quando tentamos entrar no Berghain, fomos barrados pelo segurança mais famoso de Berlim. Um homem enorme e mau encarado com uma tatuagem no rosto. O Berghain fica numa rua de terra, por trás de uma estação de trem, a Ostbahnhof. Não existe sequer uma placa indicando ser lá o lugar. Na Watergate, outra boate super famosa, só se vê um símbolo muito pequeno da boate na entrada, indicando que é ali mesmo o lugar. Já a entrada do Icon, boate onde todo sábado tem drum n' bass, não é nada convitativa. Uma placa meio torta, caída e suja com o nome Icon. Uma escada leva você até o subsolo, até então não se escuta nada, não se vê ninguém. Quando a porta é aberta... O lugar pegando fogo. Cena drum n' bass roots!

Posso passar horas falando desses lugares. Na verdade, quase tudo em Berlim é secreto, escondido. A cena da cidade parece não ser para todos, se esconde em buracos e porões. Uma cidade onde o que é normalmente chamado de alternativo é o que predomina e o que é "sujo" e sem ordem, se torna o normal, o cotidiano.

Não bastasse, achamos mais um lugar secreto, o Spreepark. Parque de diversões antigo, há oito anos abandonado e fechado. Em breve vamos explorar o lugar.

Urso Polar

Sol
Amigos em visita no final de semana à Weimar, disseram ter visto o sol. Segundo eles, no sábado, logo após o almoço, o sol pôde ser visto por cerca de duas horas. Disseram terem ficado alucinados com tamanha maravilha. E eu fiquei me perguntando se não tiveram uma alucinação coletiva.

Ainda frio
Enquanto isso, em Berlim, a neve começa a derreter. Chove em vez de nevar e a temperatura já está mais agradável, algo em torno de 0°C. Entretanto, o sol nem dá sinal de vida e ainda, daqui uns dias a temperatura cairá novamente. Ontem no metrô, enquanto falámos sobre a temperatura agradável que fazia lá fora, vimos a previsão de tempo para semana, -10°C na quarta-feira.

Desespero
Nesse contexto, ando em busca de luz. Passei cinco minutos namorando uma máquina de bronzeamento artificial. Por 4 euros posso passar alguns minutos fritando naquela coisa. No máximo, por favor. Mas acho que aí já é demais.

16.1.10

Verão, svp.

Ando sentindo uma enorme necessidade de sol. Acordo, o céu tá branco. Chego em casa de noite, o céu tá cinza-claro. Quase não muda. O sol há dias que não aparece, o azul do céu só vejo em foto. O problema não é tanto o frio, mas sim esse ambiente, digamos, opressor. Sem céu, sem sol, sem o verde das árvores. Sempre tudo no escuro, tudo cinza, sem vida.

15.1.10

Make yourself

Imprimo um documento de quase 200 páginas, pergunto se é possível encadernar, a moça fala que claro que sim. Custa mais 1,50, fala. Deixo o dinheiro e falo, obrigado, volto logo. Ela fala que eu mesmo tenho que fazer isso, me ensina como faz, diz também ser estudante e que não é paga pra fazer isso e senta de volta no computador. Aqui quase tudo é assim, ninguém faz nada pra você. Ótimo. E eu acostumado com as copiadoras em volta da UFPE, onde a gente ia no começo da tarde deixar um livro para ser copiado ou um documento grande pra imprimir e a moça falava, volte lá pro final da tarde, de noitinha. A gente chegava lá e ainda não estava pronto. Aí a gente falava, mas tia, a senhora não disse que era no final da tarde? Então ela fazia nas pressas e entregava a encomenda. Isso tudo, claro, quando tinhámos sorte. No geral, para uma xerox completa de um livro, era preciso uma semana. E ser dessemos azar, a xerox vinha tão clara ou então com as páginas completamente fora de ordem, que era quase impossível entender alguma coisa.

14.1.10

Supermercado

Pela primeira vez no ano fui fazer compras no supermercado. Durante esses dias só ia lá, pegava vinho, pão, queijo e pizza, e partia. Suficiente, não? Como resultado dessa dieta balanceada, fiquei doente. Mas nada sério, amanhã devo estar novo. Comprei muitas verduras, nenhuma fruta, um licór que tava promoção, salada tailandesa em vidro (isso é total novidade pra mim), coisas pro jantar de hoje e pro almoço de domingo. Passo no caixa, aqui na Alemanha é umas das coisas mais rápidas e eficientes do mundo. Pra mim chega a ser estressante, se você vacilar e demorar pra colocar as coisas de volta no carrinho, ou pior, inventar de embalar no caixa mesmo, a fila se enfurece, a mocinha do caixa faz cara feia, um horror. Aqui não existe fila de idosos, não é necessário, a fila já anda bem rápido, devido à eficiência acima citada. Na verdade, os idosos não têm nenhum tipo de "regálias" aqui. E vivem muito melhor que nossos velhos no Brasil. Depois escrevo sobre, é importante. Claro, aqui você tem que comprar a sacola, ou então você leva aquela sacola de pano, já surrada, que você usou várias vezes para levar os ingredientes de um churrasco num domingo de verão. O carrinho é preciso devolver pra pegar de volta o 1 euro ou uma fichinha que você colocou na hora de pegá-lo. Claro, carrego comigo a fichinha. Devido a liquidez do 1 euro e de seu valor corrente, uma cerveja no turco da esquina, seria difícil sempre ter exatamente 1 euro na carteira. Ele vai embora fácil. Sempre prefiro o Kaisers, tem um em cada esquina da rua de casa, então sempre passo lá, independente se pego o S-Bahn ou o U-Bahn. No Kaisers tem pizza barata, pouco mais de 1 euro, vinho barato de qualidade duvidosa (os bons são mais de 4 euros), queijo muito barato (Gouda, 250 gr por 1 euro!) e as caixas mais bonitas que eu já vi na vida. A mais recente é linda e infelizmente nada simpática. Na fila do Kaisers sempre escolho o caixa onde está a mocinha mais bonita, quase sempre vou na linda e antipática. Isso eu também faço na fila do Mensa, mas lá não vou atrás de beleza, e sim de simpatia. A segunda da esquerda pra direita é um amor de pessoa. Sem ser o Kaisers, tem o Penny, Netto, Rewe, Aldi e o Lidl. Esse último o que fui hoje, e onde geralmente vou quando tenho que comprar bastante coisa. Ou então, o Netto, onde roubamos o carrinho da última vez.

13.1.10

Caminho

No último metrô da noite, já madrugada, três operários à caminho de casa. Um lê o jornal eletrônico do metrô, outro lê um livro e o último contempla com olhar vazio a janela, o nada. Todos carregam expressões neutras. Sophie-Charlotte-Platz, hora de descer.

Nosferatu

Terça-feira à noite, Babylon Kino, Rosa-Luxemburg-Platz, muita neve, temperatura negativa. Fila enorme na frente do cinema para assistir Nosferatu com piano e coro. Depois de muito esperar, conseguimos entrar. Lá dentro só tinha lugar no chão. Sentamos, tiro os sapatos. Assim que começa o primeiro ato, abro o vinho que havia levado. Essa combinação, vinho e cinema é incrível. Na Alemanha se pode beber em qualquer lugar, país boêmio. E que lindo é, ver cinema lotado, sem mais lugar pra sentar, gente sem conseguir entrar, aquele ambiente de cinefilia, a expectativa para as cortinas se abrirem e o filme começar. Ontem os organizadores ficaram admirados com tanta gente e agradeceram por termos comparecido. Nós que agradecemos por manter bem vivo o expressionismo alemão.

Não quero aqui escrever sobre o filme. Seria muito pra mim escrever sobre. Nunca havia visto Nosferatu, com exceção do começo do primeiro ato. Fiquei impressionado com a variação das saturações do filme. Nunca havia visto isso num filme monocromático. A cena onde aparece a sombra enorme do vampiro abrindo a porta para atacar a mocinha é de dar arrepios. Está aí a assinatura de obra expressionisma alemã.

No final, aplausos entusiásticos. Pro filme, pro coro, pro pianista? Muitos aplaudiam de pé.

Garrafa de vinho vazia.

Atentados

Já o vizinho de Gaza, pergunta ontem para minha amiga como é possível conseguir uma matrícula numa universidade da Polônia. Ela pergunta porque justo a Polônia. Ele fala que quer apenas tirar o irmão de Gaza, qualquer lugar que seja. Muitos atentados, argurmenta. Para mim não é nenhum espanto, muito normal que brasileiros não queram mais morar no Brasil devido a violência. Isso parece ser evidente até para os estrangeiros. Meu vizinho não me perguntou como faria para o irmão ir morar no Brasil.

Okupa

Encontro irmão do vizinho que vem da Faixa de Gaza na cozinha. Ainda por aqui, pergunto. Pois é, meu apartamento em Wedding continua ocupado por estudantes do Yemen, me responde. Fazem piada da propriedade privada nessa cidade.

12.1.10

Preguiça

Hoje queria passar o dia em casa sem fazer absolutamente nada, me mexer apenas o suficiente pra poupar energia. Ler até não aguentar mais, escrever até não poder, deitar, dormir. Ler as aventuras de Ignácio por Berlim para continuar me inspirando, escrever. Ler Kafka até ficar deprimido, não aguentar mais ler um parágrafo e jogar o livro longe. Ou então ver e rever a alguns filmes que estão na lista, Salò, Tempos do Lobo, DeathProof, Donnie Darko e aquela série russa, Brigada. Lá fora faz frio, tudo branco, e ainda tá ventando pra dizimar qualquer vontade interior de sair de casa. Mas preciso ir na prefeitura e na agência de emprego. Começo de ano, burocracias alemãs. Antes o segundo andar vermelho me espera. Escuto Rage para me animar.

Russo - Pt

Amigo me liga, diz ter um amigo russo que quer praticar português agora na hora almoço. Fico surpreso por muita gente querer aprender português. Me pergunto, pra quê? Uma língua que é só é falada no Brasil, Portugal e mais alguns poucos países. Nesse racicíono, pra quê alemão? Uma língua que só se fala aqui na Alemanha, parte da Suiça, Áustria e mais alguns poucos lugares. E pra quê italiano, que só se fala lá mesmo? E pra quê, pra quê... Nesse raciocínio só se falaria inglês e espanhol. Voltando ao amigo do amigo, falei que hoje não dava, mas que na próxima vez irei, também pra aprender russo. Mais fácil que polonês, essa última, com seis declinações e pronúncia de pedra, quase impossível para mim. Apesar de, na última vez, umas das minhas vizinhas polonesas ter tido que eu tinha a pronúncia boa para o polonês. Acho que não. Ela devia tá me cantando e eu não entendi.

11.1.10

Caos

Na mesa, garrafas de vinho, copo com pontas de cigarro, fumo espalhado, copos sujos, papéis espalhados. No chão minhas roupas, grades de cerveja, camisinhas e muita sujeira. O chão virou lixo, o lixo virou chão. Minha vizinha entra no quarto e assustada pergunta, como você consegue viver assim? Amanhã, arrumo sem falta.

Cabelo

Ninguém tava com tempo para cortar meu cabelo. Esperei alguma oportunidade por semanas e nada. Cheguei hoje no quarto, peguei a máquina e cortei eu mesmo. Acho que fiquei parecendo um Hare Krishna. Chega minha amiga libanesa no quarto e diz que estou parecendo um punk.

Leste-Oeste

Há vinte anos atrás não era tão simples cruzar Berlim. Já existiam a maioria das linhas e estações de hoje, entretanto tinho o Muro, sim o Muro. Mas o trem não passa por baixo e/ou por cima do Muro? Sim, mas as estações na RDA eram bloqueadas, soldados guardavam as estações, abandonadas, estações fantasmas. Isso quem me disse foi Ignácio. Hoje saí do Zoologischer Garten - antigo centro da Berlim Ocidental, e fui até a Alexander Platz - antigo centro da Berlim Oriental. Em cerca de 20 minutos é possível se fazer esse trajeto com o S-Bahn. Fui até lá comprar um ingresso para assistir Nosferatu amanhã no Babylon Kino. O filme será acompanhado de uma orquestra. Paguei 14 euros por isso, dei o dinheiro com muita pena. Mas concordei com o rapaz do cinema que disse ser um evento quase único na vida. No Babylon sempre passa nas segundas terças-feiras do mês filme mudo com acompanhamento, geralmente de piano. Mas com orquestra, creio ser a primeira vez. Uma vez teve algo parecido no Teatro Santa Isabel, em Recife, mas acabei não assistindo nada.

Na verdade fui até lá com o pretexto de andar sem rumo pelas ruas cheias de neve, observar as pessoas, pensar, conversar com desconhecidos, pensar, tirar alguma fotos, andar, andar. Precisava fazer isso a tempos, tava enlouquecendo com a rotina de casa-faculdade-casa nos dias de semana.

Na volta pego o U2 na Rosa-Luxemburg-Platz, vou pra casa. Me lembro que tenho que assistir outro filme na semana, Avatar 3D, na Potsdamer Platz, onde o metrô vai passar de todo jeito. Desço na estação, antes cruzo o "Muro", dessa vez por baixo dele. No Sony Center, onde fica o Cine Star Imax, enorme e luxuoso multiplex, estão preparando o tapete vermelho para a Première de Sherlock Holmes. Pergunto como faço para ganhar um par de convites. Só para convidados. Ah, obrigado. Avatar 3D para quarta-feira de 21h, em algum lugar da fileira B por favor. Pois não, senhor. To muito alemão mesmo, comprando ingresso de cinema dois dias antes da exibição, isso eu só fazia na Expectativa do Cinema da Fundação. Mas como em Recife na Expectativa, os ingressos esgotam sempre, aqui para as exibições 3D. Dou uma volta na Postdamer Platz, uma espécie de centro comercial que foi forçado para ser um centro. Sendo que não funcionou, não se sente que está no centro da cidade, pode ser que se sinta como na Canary Wharf em Londres, com seus prédios imponentes e envidraçados. Mas nunca como na Conde da Boa Vista. Na verdade Berlim não tem um centrão como a maioria da cidades do mundo. Não existe um lugar que você vá e encontre tudo. Está tudo espalhado, cada bairro tem seu centro comercial. Acho isso estranho. Caminhando pela Pots (como sempre chamo), vejo os cartazes para a exposição sobre Metropolis que começará no final de janeiro, já próximo da Berlinale, onde o filme será exibido na sua nova versão no Portão de Brandemburgo. Passo na frente do Cinemaxx e vejo os cartazes para a Berlinale, no dia 08 de fevereiro começam a vender os ingressos para o festival. Lá no Cinemaxx era dia de Première, filme que acabo de esquecer o nome e trata de dois "ozzys", os primeiros a chegarem nos EUA, depois da Queda do Muro. Novo grande projeto da MedienBoard, produtora com sede em Postdam. Mesma que produziu A Vida dos Outros. Pergunto de novo, e esse convite, como faço? Só convidados. E os carros pretos não param de chegar no tapete vermelho.

10.1.10

Domingo

A janela embaçada, acumula neve, o café ajuda a esquentar e a manter acordado. Amanhã tenho um trabalho para apresentar, o que será minha primeira apresentação em alemão - no outro semestre o esquema foi outro e mesmo assim não deu certo. Como não podia deixar de ser, tudo pra última hora. Queria muito poder preparar os slides em inglês e apresentar em alemão, casamento perfeito. Mas os colegas de grupo já fizeram tudo em alemão, então tenho que encarar esse desafio que é traduzir todos esses termos econômicos. O assunto eu sei perfeitamente, a bronca é como sempre, a língua.

A neve chega no meio da canela...

Assim cantaria Chico Science se tivesse de andada feito caranguejo por Berlim.

Fui hoje comprar minha câmera (sim finalmente comprei uma slr, uma Nikon D3000, possível graças ao meu trampo de papai noel na véspera de natal. Sim, eu fui o papai noel.), peguei a bicicleta que havia outro dia achado embaixo do prédio, ao lado da minha outra que havia sido presente de um amigo, o cadeado teimava em não sair, estava congelado. Temperatura negativa, vento fortíssimo, mas mesmo assim, bike! Trem atrasado por conta da neve. Vou para fora de Berlim para comprar um tênis que preste antes que perca os dedos dos pés. Elstal, extremo oeste, antiga RDA. O trem pára na estação, mas é pra descer? A neve encombre tudo, não é possível descer. Mas o funcionário do trem (que havia falado berlinense o caminho todo e eu só fui perceber depois de uns 10 minutos o que ele falava) falou que era pra gente descer. Eu e mais dois coreanos, ou japoneses, ou vietnamitas, enfim pessoas dos olhos puxados, ficamos parados, pensando se era mesmo possível sair do trem. Saímos, a neve chegava no meio da canela, a bicicleta queria ficar pelo caminho, os pés congelavam. Saindo da estação, monto na magrela. Uma das coisas mais divertidas é pedalar na neve, uma mistura de lama com areia fofa, não escorrega tanto como eu pensava, mas não invente de puxar o freio da frente numa ladeira, senão é queda na certa. Aprendi isso muito bem aprendido numa queda em ladeira de pedras em algum lugar da Zona da Mata pernambucana, quatro pontos no braço. Chegando no Outlet Berlin, centro de lojas de fábrica com super descontos, deixo a magrela do lado de fora. Vou na Nike, Adidas e Puma. Na Nike não consta uma só palavra em alemão, somente inglês. Orgulho de ser americana, realmente admirável. Me decido por uma Adidas de couro, bom pra neve, 26 euros. Ainda falta uma hora pro próximo trem, então vou comer algo. Só vejo o símbolo da McDonalds brilhando à minha frente. Parece que compras pede um BigMac ou coisa parecida depois para se comemorar. Coisa engraçada esse consumo compulsivo. O capitalismo é mesmo engraçado. Nenhum turco vendendo dönner, nenhum libanês vendendo scharwma, nenhum chinês vendendo macarrão na caixinha. Que merda, vou almoçar um McLancheFeliz. Se é pra ir lá, que se vá de vez. Desde que moro aqui não tinha ido em algo do tipo, só em Londres e Amsterdam onde é mais barato que turcos, libaneses e chineses. Peço então um BigTastyBacon com batatas. Tomo um litro de Coca-Cola, e depois de observar as pessoas comendo e conversando, brincar com um Labrador que tava do meu lado, parto. Cadeado não quer sair, congelado, claro. Depois de dez minutos numa espécie de masturbação para desgrudar as duas partes do cadeado, consigo soltá-las. Quase um orgasmo. Estou atrasado para pegar o trem, passará em menos de 10 minutos. O percursso de bicicleta se faz em cerca de 12. Corro como um louco, subindo ladeira na marcha pesada, descendo ladeira sem freiar. Quando ponho o pé na plataforma, o trem pára. Do caralho! Entro, me esquento, mando mensagem dizendo que em uma hora estou na Neue Nationalgalerie pra ver Miró, Picasso, Magrite e Dalí. Uhu! Duas estações depois, um comunidado de cinco minutos avisa que devido a neve, o trem não pode prosseguir. Sem problema, estou com O Verde Violentou o Muro na bolsa, Ignácio tá virando um brother já! Um casal está na minha frente, o homem se desespera, diz ter uma coisa importantíssima, que não pode de maneira alguma se atrasar, a mulher tenta acalmá-lo, ele se impacienta mais, a mulher se irrita, ele vai na frente falar com o maquinista e volta um pouco mais conformado. Os dois estão com a camisa do Depeche Mode, lembro que o show é hoje! Pergunto de que horas é o show, falam que daqui a duas horas, então vocês conseguem, digo. Eu particularmente ficaria no mesmo estado do homem se algo do tipo acontecesse antes de um show que quisesse muito ver. Na verdade ocorreram várias coisas antes do show de Massive Attack, quase perco o show. Um senhor chega e senta, uma funcionária da DB (companhia de trem alemã) aparece, todos começam a reclamar, descobre-se que existe ônibus logo em cima. Ninguém havia nos avisado. Continua a nevar de maneira assustadora, a neve encombre tudo. Mais quinze minutos pro ônibus. Ela me liga, digo que não consigo chegar a tempo no museu, ela diz - de novo!! Mas, mais uma vez, não é minha culpa. Não me odeie tanto, vamos amanhã? O senhor que havia aparecido no trem começa a falar da história do lugar onde estamos - em Berlim qualquer coisa tem história. Estamos numa ponte, de um lado foi a RDA, do outro a RFA, estamos no extremo oeste da parte ocidental, já na outra divisa com a Alemanha Oriental. Ele fala bastante sobre a estação, mas não entendo muita coisa, sotaque de Berlim é difícil de entender e eu não queria interrope-lo. O ônibus chega, o motorista fala que não posso entrar com a bicicleta, falo que a culpa toda é da BVG (sistema de transporte de Berlim), e depois de todos argumentarem a meu favor e contra a BVG, ele me deixa entrar com a magrela. Sento, descanso, falo sobre shows com o casal e maneiras de vê-los de graça em Berlim. Fico surpreso e agredecido com mais informações preciosas. Chego na estação do trem subterrâneo, me despeço. A neve continua. Chego em casa, só quero um café. Digo: hoje fico em casa, durmo cedo e amanhã eu estudo. Depois de três cafés, já mudo de idéia completamente. Hoje é dia de Balkanbeats!! Uma das melhores coisas que existem em Berlim, e só acontece uma vez por mês. Gasto todo meu dinheiro, ainda não sei como, pois não estou nem bêbado. Sobram ainda 3 euros para um dönner, mas deixo pro Museu. Agora em casa, só preciso escrever pra dormir. Comer algo fica pra manhã, um café com tiramisu me espera no café da manhã.

8.1.10

Am Zoo

Hoje fui no Zoo, já era noite, a neve havia congelado, só havia blocos de gelo, um branco não mais tão branco como neve, pixações na entrada do metrô e muito lixo. Com o fim do tempo de natal, o mercado natalino já não habita mais a praça em volta da Gedächtnis-Kirche, com isso pessoas vendendo todo tipo de droga voltaram a habitar o lugar. Essa decadência não deve ser muito diferente do tempo de Christiane F., onde adolescentes se prostituam na mesma estação.

Vou andando com o coração apertado, a cabeça não pára em um pensamento, as mãos congelam no frio, já não sinto mais meus dedos que seguram o dönner que comprei na Kantstrasse, o corpo dói pelo trabalho e pelas noites mau dormidas.

Enfim, casa. Só quero escutar as vozes animadas no bar lá embaixo e abraçar quem me dá intimidade para tal.

7.1.10

O Verde, O muro.

Ultimamente ando com uma vontade enorme de escrever sobre tudo que vejo, sem deixar passar nada, nem uma reflexao sequer. Infelizmente nao encontro tempo para tal, a Uni e meus sempre eventuais bicos me tomam todo o tempo. Nos tempos livres, invento mil atividades, encontro com meus amigos, converso e bebo pelas madrugadas.


Ando me inspirando muito para escrever, sobretudo sobre Berlim, devido ao Verde Violentou o Muro, de Ignácio Loyola Brandao. Livro que narra as experiencias de Ignácio em Berlim, onde morou durante 15 meses nos anos 80. O contexto era outro, mas as impressoes dele sobre a cidade parecem ser as mesmas que as que tenho hoje. No livro ele fala que nao consegue explicar direito o que é isso tudo aqui. Assim como a citacao logo no comeco do livro de Hans Christoph Buch:

„Algo com detalhes tao fantasticos que é dificílimo, quase impossível, explicar a um nao-berlinense. Uma situacao com nítidos contornos de ficcao científica, sem ser contudo: é a vida normal em Berlim – a normalidade do anormal.“

Livro esse que minha mae sempre falou para eu ler, e que, nao sei porque, sempre ignorei. Logo ela que indicou uma das minhas primeiras e melhores leituras, O Admirável Mundo Novo, de Huxley. Foi preciso vir um amigo de Recife, me trazer o livro que ela deixou com ele, para eu pegar e abrir na primeira página. Desde entao, nao consigo mais parar de ler. E agora, comeco a entender melhor a cidade onde vivo. Vontade de sentir cada cheiro, entrar em cada buraco, ir em todos os bares, ocupacoes e estacoes para conversar com todas as pessoas e escutar o que elas tem para contar.

Estou quase tomando uma decisao radical de quase nao fazer mais nenhuma viagem, respirar mais Berlim e com o dinheiro que nao gasto com as viagens comprar minha camera SLR. Assim posso também registrar melhor tudo isso aqui.

Agora escrevo um texto para apresentar semana que vem. Pois é, isso nao estou com inspiracao nenhuma, nao pelo tema, que até me interessa. Mas sim, pelo fato de ter que ler em ingles, pensar em portugues e escrever em alemao. Uma confusao.

O lugar onde estou, uma sala com mais de cem computadores, está completamente lotado. Todos escrevendo seus artigos, fazendo seus portfólios, editando fotos. Sao seis horas da noite, a foma comeca a apertar. Vou descer pro Atomic Café, lugar que descobri ontem através das francesas. O café é o único da universidade que fecha depois das 21h e fica no prédio de física. Lá voce mesmo se serve e voce mesmo paga, ninguém controla isso. E claro, funciona muito bem.

*Teclado evidentemente alemao.

6.1.10

Germania Anno Zero

O lugar, um prédio do pós-guerra no centro de Berlim. No porao, em meio a toneladas de tijolos e paredes derrubadas, me sentia como no filme de Rosselini. Entretanto, nas eventuais idas à rua, me deparava com restaurantes tailandeses, japoneses, italianos e argentinos; com pessoas de óculos quadrados e aros petros e com cabelos diferentes e coloridos, onibus de dois andares fazem a conexao com a estacao central, carros de polícia passam com as sirenes ligadas. Isso tudo me faz voltar ao século 21. Mas se eu permanecesse durante todo o dia nesse porao, me sentiria como no pós-querra, como no ano de 1948, quando data a obra-prima de Roselinni, entres os escombros do ataque a Berlim, em busca de vidas deibaxo de pedras e poeiras. E talvez pudesse de fato regressar no tempo, acharia bombas e corpos debaixo dos escombros. Porém, nao achei nada mais que idéias, minhas próprias histórias e lembrancas.

4.1.10

Bärlein

Antigo centro de espionagem da CIA no Teufelsberg; Flohmarkt e Karaoke no Mauerpark: West Side Galery em Kreuzberg, Dönner na Kantstrasse ao lado da Gedächtnis Kirche, Humana second hand; metrô com seu cheiro e pessoas loucas; se embriagar no Weinerei Café; boate russa no Kaffe Burger; BalkanBeats no Lido; rock no White Trash Food; Club der Visionaire e Badeschiff no verão; percorrer toda a cidade de bicicleta; street art pra onde você olhar; Fersehenturm nos obversando o tempo todo; Drum n' Bass no Icon; minimal no Tresor; cerveja turva de barril no DIE kneipe; Bierkeller no Siegmunds Hof quando não tem nada pra fazer; Kino International com tela Scope largona; Kastianenalle com lojas cults; sebos de livros por toda a cidade; todo mundo nú na FKK do Wansee; rave nos parques até a polícia chegar; primeiro de maio violento e divertido; RingBahnParty, a festa no metrô; Schwarma Box no Falafel Ufo; bebida barata no Barato; Café Zapata; linha U1 sentido Warschauer Strasse à uma da manhã; Torstrasse; Oranienstrasse; Schlesiches Tor; Goriltzer Bhf; Späti!; Glühwein com Amareto em algum Weihnachtsmarkt pra esquentar; 10 centimetros de neve; Berliner Pilsen, Berliner Kindl, abrir garrafas com o isqueiro; [...]

1.1.10

Flickr plus 1000 / Twitter / Happy new year!

Minha página no Flickr virou o ano com mais de 1000 viisualizações. Com pouco mais de 6 meses de criação e com quase 150 fotos dos lugares que já andei desde que moro aqui na Europa, sendo a metade das fotos apenas de Berlim. No Flickr também dá pra aprender muitas coisas e ter muitas idéias vendo as fotos de outras pessoas, um ótimo exercício. Isso coincide com a lente da máquina suja mais uma vez. Vou ter que deixar na assistência de novo e ter que esperar duas semanas pra máquina ficar pronta. Da primeira vez foi culpa da areia do Saara, agora foi neve aqui em Berlim. E logo agora que cerca de 10 centímetros de neve cobrem a cidade, na fissura de fotografar tudo.

Me rendi e fiz uma conta no Twitter. Mas ainda não escrevi nada lá, estou acanhado. Depois vejam lá.

Desejo a todos um Feliz ano novo e um 2010 do caralho! E espero que esse ano seja tão bom e frenético como foi 2009!

jO, janz jut!!!